Sunday, September 20, 2009

Astrobrasilis

Rio de Janeiro, início de agosto, 2009. na Assembléia Geral da União Astronômica Internacional (UAI GA, na sigla em Inglês), a comunidade científica estava em polvorosa. Entre astrônomos, engenheiros, estudantes, cientistas do primeiro escalão da pesquisa mundial e representantes dos mais diversos países, uma enorme confluência de línguas e culturas, numa verdadeira celebração da ciência mundial. Neste ambiente entusiasmante, conversei com um dos nomes mais respeitados da Astronomia brasileira, o prof. João Steiner. Entre os vários cargos que já exerceu, Steiner foi secretário de Coordenação das Unidades de Pesquisa do Ministério de Ciência e Tecnologia,  presidente da Sociedade Astronômica Brasileira, vice-presidente do consórcio internacional Gemini e diretor do Instituto de Estudos Avançados (IEA) da USP, e é conhecido no Brasil e na cena mundial por ocupar a presidência no Conselho Diretor do Consórcio do Southern Astrophysical Research (SOAR) Telescope, cargo a que foi eleito e que envolve esforços em conjunto do Chile, EUA e Brasil para a construção de um telescópio para ser operado nos Andes chilenos.

Conversamos um pouco sobre a assembléia da UAI no Rio de Janeiro e a Astronomia no Brasil.

Como foi a escolha do Rio de Janeiro para se fazer a GA deste ano?

Isso é uma história curiosa, porque é algo muito disputado. E mais ainda porque essa reunião só ocorre uma vez a cada três anos. Veja bem: nos últimos 30 anos só aconteceram 10 reuniões em 10 países diferentes. E nunca houve no Brasil. Então nós decidimos concorrer, e a concorrência foi dura, porque concorremos com a China, Canadá e Estados Unidos (era pra ser no Havaí). E a China veio com muita força. Então, para a agente ter alguma chance de convencer essa reunião a ser feita no Brasil, tínhamos o Rio de Janeiro, porque o Rio tem um poder de atração diferencial, porque todo estrangeiro tem um checklist de “lugares a visitar na vida” com o Rio de Janeiro na rota. Então, é relativamente fácil convencer um estrangeiro a vir num congresso científico no Brasil, desde que seja no Rio de Janeiro. Porque é uma cidade diferente, tem muitos atrativos, a praia, da paisagem… então foi por essa razão que nós, astrônomos brasileiros, numa reunião da Sociedade Astronômica, escolhemos o Rio de Janeiro para concorrer, e graças a isso nós ganhamos da China e dos outros países.

O fato de esta GA ter sido feita no Brasil este ano tem ajudado a atrair os olhares e chamar mais a atenção para a Astronomia que é feita aqui?

Eu diria o seguinte: na verdade, a astronomia brasileira tem tido bastante apoio do governo federal, bastante apoio dos governos estaduais – pelo menos no estado de São Paulo, não é? -  e nós não podemos nos queixar por falta de apoio. Então, eu não diria que aumentou o apoio, porque ele já existia. O que acontece – e isso sim foi um diferencial – foi o seguinte: coincidiu também de esse ano ser o Ano Internacional da Astronomia (AIA). E isso sim foi um diferencial muito grande, porque deu muita visibilidade para a Astronomia. Então, juntou-se o AIA com (a reunião da) União Astronômica Internacional, e isso sim reforçou uma certa sinergia para essas coisas todas, e deu uma visibilidade muito boa nos meios de comunicação, na imprensa, junto à opinião pública e uma certa repercussão também junto ao governo.

Então o retorno não foi necessariamente em termos financeiros, mas principalmente em valor agregado, com mais gente interessada…

Isso, mais gente… e eu acho que o diferencial foi muito mais para a sociedade do que com relação ao governo.

E isso teve algum impacto na pesquisa científica no Brasil de alguma forma?

Eu diria o seguinte, eu diria o contrário: talvez a razão mais importante porque a reunião é aqui é porque isso é um reconhecimento da comunidade internacional de que existe uma ciência sólida sendo feita no Brasil. É um reconhecimento disso. E a gente pode confirmar isso com o número de astrônomos brasileiros que estão participando com trabalhos. Eu até tenho esse dado em algum lugar por aqui, e me parece que é da ordem dos 300, bom, 360 astrônomos brasileiros inscritos no congresso. O que é um número muito alto, considerando que no Brasil existem hoje, contando pesquisadores com doutorado e alunos do mestrado e doutorado que trabalham em tempo integral em Astronomia são 500, 508. E é muito. Em 1970, eram dois, três. Agora são 500. 508. é um crescimento extraordinário, não é? E muito recente. Eu sou uma das pessoas mais velhas  – como você pode ver, sou muito jovem, totalmente jovem, né? (risos) – na área. Eu fiz doutorado em 1979. Fui o quarto doutorado na USP na área de Astronomia. Então isso, do ponto de vista da história da ciência, é algo muito recente.

E então, o que se faz em Astronomia hoje no Brasil? Quem são os nossos maiores parceiros em cooperação científica internacionalmente?

Nós temos muita cooperação com os Estados Unidos e com a Europa (…) só que os nossos projetos, os nossos grandes telescópios (somos parceiros nos projetos Gemini e Soar, que são dois grandes telescópios), ficam um no Havaí e um no Chile. São telescópios fantásticos, entre os melhores do mundo, e nós somos sócios. O Soar, por exemplo (cuja construção é liderada pelo prof. Steiner) é uma parceria com os estados Unidos, que conta com três instituições americanas. Nós temos 34% das ações. E no Gemini são seis países, sendo que o principal também são os Estados Unidos. Então sob o ponto de vista de iniciativas estratégicas e grandes equipamentos nesses projetos, o grande parceiro são os Estados Unidos. Mas do ponto de vista de cooperação científica, nós temos um pé nos Estados Unidos e outro na Europa.